Serpente se alimentou de um cardeal-do-nordeste na cidade de Lençóis (BA). Flagrante feito por bióloga revela comportamento de caça do réptil
A jiboia tem um jeito peculiar de atacar as presas. Sendo uma serpente constritora, a tática principal não inclui inoculação de veneno, mas sim asfixia. A serpente dá o bote e morde mas, logo em seguida, já se enrola e começa a comprimir a presa que, ao ficar sem ar, morre. Depois, a jiboia engole o alimento por completo, com uma capacidade surpreendente de abrir a boca.
“A mandíbula dela não é presa na articulação temporomandibular (ATM) e a parte anterior também é adaptada. Quando ela ingere algo grande, a mandíbula separa da maxila permitindo que ela aumente o tamanho da boca”, explica o especialista em serpentes Willianilson Pessoa.
Parte desse processo foi observado de perto pela bióloga especialista em aves Cristine Prates no começo de março, quando uma jiboia predou um cardeal no quintal dela, na cidade de Lençóis (BA).
Cristine mora em uma área próxima à mata e conta que um belo dia flagrou a serpente embaixo da pia da cozinha, trocando de pele. “Ela era uma jovenzinha, bem pequena (cerca de 35 centímetros) e eu, que gosto de todos os bichos, acabei deixando ela por ali, não quis tirar. Algumas vezes vi a serpente passeando pelo quintal e percebi que estava comendo muito sapo, porque aqui tem bastante”.
Jiboia mata as presas por asfixia — Foto: Cristine Prates
Mas em uma manhã chuvosa, Cristine escutou um bando de gralhas-cancã (Cyanocorax cyanopogon) vocalizando bem alto junto a outras aves o que, de acordo com ela, é sinal de alerta da presença de algum predador.
“Fui no quintal para ver o que estava acontecendo e a jiboia já tinha enrolado um cardeal-do-nordeste (Paroaria dominicana) jovem. Não interferi em nada, só fiquei filmando e esperei ela terminar de comer, ficar tranquila e seguir o próprio caminho”, relembra.
Cristine tem um comedouro no quintal que atrai diversas espécies de aves. Ela também espalha quirela pelo chão para alimentar indivíduos, como o cardeal, que têm o costume de passar mais tempo na terra.
“As aves estão acostumados a comer ali com tranquilidade, então foi uma forma que a jiboia viu de se alimentar mais fácil, principalmente de um jovem inexperiente. E é isso, às vezes a gente fica apegado com os bichinhos que a gente vê todo dia aqui no comedouro, mas faz parte da cadeia alimentar dos animais e a gente não pode interferir”.
Registro do gavião-carijó sendo predado já foi visualizado por mais de 60 mil pessoas — Foto: Pablo Souza/ Arquivo Pessoal
De acordo com Pessoa, a jiboia do vídeo deve ter em torno de quatro meses e a espécie tem uma dieta extremamente diversificada. “Quanto maior a presa, mais tempo é necessário pra digerir e mais tempo a serpente consegue ficar sem comer. Nesse caso, depois de predar o cardeal, acredito que ela tenha esperado até uma semana para comer de novo”, esclarece.
Depois de filmar a cena, Cristina foi viajar e não viu mais a serpente. Como jiboias podem viver por até 20 anos, é possível que o réptil apareça novamente na casa da bióloga.
Fonte: G1