Mediados pelo MP BA, sociedade civil, lideranças políticas e comunitárias, pesquisadores e representantes do governo discutiram a importância e a urgência da criação da unidade de conservação.
No sábado (15) pela manhã e início da tarde, foi realizada a primeira audiência pública para a criação da Unidade de Conservação da Serra da Chapadinha. O encontro teve mediação do Ministério Público da Bahia por meio dos promotores Alan Cedraz e Thyego Matos e reuniu representações do Ministério Público Federal, autoridades públicas, associações civis e profissionais, comunidades tradicionais e sociedade civil.
Em mobilidade híbrida, o encontro promoveu uma ampla discussão com contribuição de diversos especialistas que enfatizaram a necessidade de preservar a área, ainda desprotegida, que abriga nascentes de bacias hidrográficas e espécies de fauna e flora ameaçadas de extinção, além de sítios arqueológicos de arte rupestre e uma grande riqueza cultural das comunidades que vivem no entorno.
Presencialmente, o encontro foi realizado na Escola Municipal Cazuza do Prado, em Mundo Novo, zona rural do município de Ibicoara, município do qual a Serra da Chapadinha faz parte, assim como de Itaetê e Mucugê. A Serra da Chapadinha fica localizada a 400 quilômetros de Salvador e é uma das principais zonas de recarga da Bacia Hidrográfica do Rio Paraguaçu, que abastece mais de 50 municípios do estado, incluindo da Região Metropolitana de Salvador.
Na recomendação feita pelo Ministério Público Federal para a criação da unidade de conservação, o procurador da república Ramiro Rockenbach, titular do Ofício Estadual Resolutivo para Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais, ressalta a importância da localidade, considerando como prioridade a ação do governo do estado para garantir a sua preservação.
“É uma área de importância biológica e de prioridade de ação extremamente altas, classificada como área prioritária para conservação, utilização sustentável e repartição dos benefícios da biodiversidade, e absolutamente vital para as comunidades tradicionais que vivem ali: assentados, quilombolas, povos de terreiro, ciganos, ribeirinhos e camponeses”, argumentou o procurador, que assinou a recomendação.
Na reunião, Rockenbach destacou a questão das águas cuja escassez, segundo ele, deve ser “um dos grandes desafios da humanidade em breve”. Fazendo referência ao desastre natural que assolou o Rio Grande do Sul neste ano, o procurador relembrou que a natureza dá uma resposta às ações do ser humano. “É necessário reaprender com povos e comunidades tradicionais a viver em harmonia com todas as formas de vida”, continuou.
A Serra da Chapadinha é um refúgio da vida silvestre, habitat natural de diversas espécies de fauna e flora, alguns endêmicos e muitos em risco de extinção, como o Guigó-da-caatinga, primata seriamente ameaçado, conforme lembrou o coordenador do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Primatas Brasileiros, Leandro Jerusalinsky.
Representando o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), a coordenadora do Plano de Ação Territorial (PAT) Chapada Diamantina Serra da Jibóia, Sara Maria de Brito Alves também apresentou espécies gravemente ameaçadas na região da Chapada, que têm ocorrência na Serra da Chapadinha.
Os patrimônios culturais da região foram lembrados pela necessidade de inclusão do meio ambiente cultural na “completude” que compõe o meio ambiente, conforme explicou Luciano de Souza e Silva, que representou o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Espaço de beleza cênica, com inúmeras paisagens e arte rupestre, a Serra da Chapadinha também foi defendida por Luciano como patrimônio histórico-cultural. “É importante a junção entre natureza e cultura nas legislações. Sítios arqueológicos, bem como matrizes originais do forró, cordel, roda de capoeira, baiana do acarajé e saberes tradicionais”, defendeu.
Questões como as maiores ameaças à área também foram destacadas, notadamente a agricultura sem planejamento, o uso de agrotóxico, algumas técnicas agropecuárias, a expansão urbana, o turismo desordenado, a especulação imobiliária e a instalação de empresas de geração de energia, especialmente as eólicas, além das mineradoras. Sobre essas últimas, o Secretário Municipal do Meio Ambiente de Ibicoara Rinaldo Rossi foi categórico: “Ibicoara não vai aceitar a mineração na Serra da Chapadinha e no território de Ibicoara”.
A escuta à comunidade deve seguir acontecendo para fortalecer o apelo para que o governo proceda com a criação da unidade de conservação da Serra da Chapadinha. Iaraci Dias, diretora de políticas de biodiversidade e florestas da Secretaria do Meio Ambiente do estado da Bahia, presente ao encontro, reafirmou a importância do debate público: “Não existe construção de unidade de conservação sem a escuta da sociedade.”
Ananda Azevedo | Foto: Duda Menegassi / O Eco